Por conta de uma ação política despropositada e sem objetivos bem definidos ultimamente, Estância tem se transformado numa cidade aquém dos desejos estancianos. Pelo menos nos conforta o fato de termos conquistado o direito de avaliar através do voto o mandato de cada gestor. Nesses tempos em que candidatos se lançam à disputa eleitoral, seria a chance para o município redefinir seu rumo. Ou não! Através de seu representante tão bem pago, espera-se que o eleito possa ter a mínima decência de solucionar os problemas mais básicos da população, sempre por eles, como de praxe, decantados: educação, saúde, emprego e renda... Mas faltaria incluir nisso tudo cultura, lazer e, porque não, felicidade! Afinal, seria bom viver em uma cidade que, de forma plena, atendesse a esses pré-requisitos.
Porém, com a reinante mentalidade política que por ora povoa a Cidade Jardim, isso não passa mesmo de um sonho pueril. Descaracterizada, Estância se tornou um arremedo da expressividade que era tempos atrás. Em que pese alguma iniciativa federal, o seu futuro preocupa. Basta ver ao longo dos anos como a cidade, tida como Berço da Cultura Sergipana, tem se tornado inexpressiva, desinteressante, tendente à decadência. Para demonstrar esse retrocesso vamos relembrar alguns de seus feitos históricos na economia, na imprensa, nas artes... Não é o fato de estarmos sendo recorrentes, mas é mostrar como a cidade perdeu de vez seu rumo. Senão vejamos.
Nos tempos de vila, bem como no período em que já era cidade (ainda no século XIX), com um invejável comércio marítimo de importação e exportação, Estância podia ser comparada a uma das grandes do Império. Em face da sua riqueza econômica, oriunda do farto plantio de cana e a consequente produção e exportação de açúcar via Porto d’Areia, a localidade também não deixou de exportar, aguardente, algodão, borracha de mangabeira e vários outros produtos, como está registrado no livro Estância Secular. Embora ainda exista seu rio navegável e sua terra cultivável, nada seguiu adiante. Tudo se findou. De resto, os históricos trapiches de quase trezentos anos, sem querer trair a riqueza da sua terra, resistem, apesar de se encontrarem cobertos pelos espinhos, urtigas e matos de toda espécie. Sem nada que lhes realcem, que lhes reinventem, a região dos antigos trapiches são um ponto morto na cidade.
Não custa nada lembrar que a imprensa sergipana nasceu aqui! Tão ousada foi a ideia que Estância (na época uma pequenina vila) se adiantou a importantes localidades brasileiras, como Curitiba (que já era cidade). Despreparados, sem uma clara leitura da história de seu povo, nossos “representantes” não se importam, desprezam. Tanto que sequer fizeram marcar em praça pública tal feito. Isso no mínimo seria instrutivo.
Mas a malfadada política estanciana continuaria em sua marcha esmagadora. Também iria destronar sua fecunda dramaturgia. Cidade famosa, onde é possível - por conta de sua tradição teatral de mais de 180 anos - encontrar em cada esquina um poeta, hoje sem qualquer incentivo, dramaturgia em Estância só a vemos se revolvermos seu passado distante. Lembramos de Joaquim Maurício Cardoso (1876-1970), um famoso jornalista estanciano, que nos inícios do século passado, indignado com a apatia política estanciana, quem sabe vendilhona (não esqueçamos a venda descarada do SAAE), quem sabe gananciosa (no caso dos acordos e negociatas) como agora, dizia que andava “a combater a sagração da treva em prol da sagração da luz”. Lembramos ainda, naqueles tempos, do desabafo do também respeitado jornalista, dramaturgo e poeta estanciano Severiano Cardoso (1840-1907), que em uma das estrofes de seu belo poema diz: “É nobre a luta [...] contra a ousada ignorância/ Que lhe aponta seus punhais!” Em outra afirma: “Dai-nos mestres e institutos/ Dai-nos livros e instrução”. Desse modo, parafraseando o escritor João do Rio, “a alma encantadora” de Estância agoniza, tristemente morre!... (continua)
Acrísio Gonçalves de Oliveira (*)
(*) Pesquisador, professor do Estado e da Rede Pública de Estância