Sem afetação, ou os tentáculos da lisonja, é quase possível dizer ou constatar que o Instituto Banese, uma das instituições do Banco do Estado de Sergipe, tem hoje o peso de uma Secretaria de Estado de Cultura, pasta que a administração sergipana, infelizmente, não dispõe e o que há com a aura de sucedânea deixe um tanto a desejar. Aliás, uma Secretaria de Estado de Cultura com resvalo para uma de Ação Social.
Em dez anos de existência, o Instituto Banese tem revelado superlativamente a que veio. Você nunca parou para prestar a atenção nele, em seus objetivos e suas realizações práticas? Pois então preste agora a partir da tradução feita pelo seu presidente, o arquiteto, poeta e multivário cidadão Ezio Déda.
“O Instituto Banese foi criado para gerir e promover os projetos e ações de cultura e de responsabilidade social do Grupo Banese. Ele é mantido pelo próprio Banese, pelo Banese Card e pela Banese Corretora de Seguros”, situa Ezio.
“Com pouco mais de uma década, sua marca é reconhecida como um dos principais agentes de inovação e de fomento cultural do Estado, apoiando mensalmente 12 instituições da sociedade civil que promovem o atendimento de crianças, adolescentes, idosos, deficientes e pacientes oncológicos ou ofertam atividades de esporte, cultura e tecnologias sociais”, reforça Ezio, melhormente.
Mas o Instituto Banese vai um pouco mais além de tudo isso. “Recentemente o Instituto Banese lançou o Projetar.SE, voltado para o suporte técnico aos municípios sergipanos, no tocante a elaboração de projetos. Outra ação marcante é a Orquestra Jovem, programa executado nos bairros Santa Maria e 17 de Março. Criada em 2014, conta com o apoio da Energisa desde sua fundação, e atende atualmente 270 crianças e adolescentes inseridos na proposta de desenvolvimento da linguagem musical”, diz Ezio.
Então, vale ou não a paridade com uma ou mais Secretarias de Estado? Mas para além dessa teoria real e plausível desenvolvida por Ezio Déda, bastaria fixar o olhar e a atenção na existência e significação do Museu da Gente Sergipana Governador Marcelo Déda, entidade mantida pelo Instituto e que está fazer agora 10 anos.
Sem cobrar um só centavo de visitantes sergipanos, de outros Estados brasileiros e países, este Museu, concebido como uma intensa novidade tecnológica, tem uma proficiência excelente no guarda e compartilhamento da memória de Sergipe e na frequência.
“A média anual de visitantes do Museu da Gente Sergipana Governador Marcelo Déda é de 86 mil pessoas. O Museu da Gente Sergipana é um importante equipamento na valorização, fomento e divulgação da sergipanidade”, afirma Ezio Déda.
“Não apenas pelo acervo permanente, mas também sendo o palco onde ocorrem programações constantes de publicações de livros, shows musicais, apresentações teatrais, exposições multidisciplinares, gravações de produções audiovisuais”, reitera Ezio.
“Dessa forma, o Instituto Banese, através do Museu, realiza um conjunto de ações e projetos exclusivamente voltados para o fortalecimento da sergipanidade. A construção do Largo da Gente Sergipana é outro projeto do Instituto Banese, cuja contribuição é intangível para o processo de valorização e reconhecimento da cultura local, produto da miscigenação dos modos de pensar, agir e sentir dos elementos étnicos formadores do povo sergipano”, afirma Ezio Déda.
Nesta Entrevista, o arquiteto Ezio Déda vai abordar uma série temas ligados à cultura, museologia, literatura, artes plásticas, arquitetura e, sobretudo, sergipanidade. Mas também reforçará a importância dos 60 anos do Banese, a serem completados agora em novembro.
Ezio Christian Déda de Araújo nasceu em Simão Dias há exatamente 46 anos completados neste sábado, 30 de outubro. Ele é 1975 e filho de José Febrônio de Araújo e de Creuza Armandina Déda de Araújo.
Solteiro, Ezio tem formação acadêmica em Arquitetura e Urbanismo pela primeira turma de uma universidade sergipana desde o segundo semestre de 1999.
Ezio Déda tem especialização em Desenho, Registro e Memória Visual pela Universidade Estadual de Feira de Santana - UEFS.
Ele preside o Instituto Banese desde 2012, mas ingressou ali em 2009, data da fundação dessa instituição.
Ezio tirou de letra as críticas tupiniquins surgidas à época em que o Instituto Banese construiu o Largo da Gente Sergipana sobre o Rio Sergipe e salpicou ali as estátuas das manifestações folclóricas do Estado - hoje, o espaço sergipano mais visitado por turistas.
“Atravessei serenamente e de tototó. Sempre acreditei que havia algo naquele lugar pedindo para existir e minha tradução não foi equivocada. Entendo plenamente o princípio do contraditório e da crítica, mas o que precisa nascer e é grande suscita sempre sentimentos adversos”, diz ele.
A Entrevista com Ezio Déda está crivada de atrativos lhe convidando para uma boa leitura.
DO FUTURO DO INSTITUTO BANESE E DO MUSEU
“No tocante ao Instituto Banese, a expansão dos serviços de atendimento aos sergipanos, em diferentes segmentos, é tratada com prioridade. Quanto ao Museu, que reabriu as portas desde o último dia 24 de outubro, além da revitalização de sua estrutura tecnológica, uma programação especial para novas exposições está em processo de construção”
DAS SEIS DÉCADAS DE EXISTÊNCIA DO BANESE
“São 60 anos de uma instituição que é um divisor de águas para o Estado. O Banese e a Petrobras trouxeram a modernidade econômica para Sergipe. É uma empresa sexagenária que possui um considerável legado de desenvolvimento, cujo vigor e entusiasmo são marcas registradas da gestão capitaneada pelo presidente Helom Oliveira”
UMA INSTITUIÇÃO VIVA QUE SE RENOVA
“O Museu evoluiu e se reinventou. Durante a pandemia, a estrutura tecnológica foi completamente atualizada, e com a inserção constante de novos conteúdos gerados através de exposições e de demandas que observamos no decorrer das atividades educativas desenvolvidas”
JLPolítica - O banco tem um bom extrato de futuro?
ED - Os projetos em andamento, preparam o Banese para o futuro através da implementação de ações estratégicas em áreas fundamentais, como tecnologia, expansão para outros Estados, ampliação de investimentos em desenvolvimento da cadeia produtiva local, nos setores imobiliário e do agronegócio, além da ampliação do apoio cultural e social. O Banese é a única instituição oficial, entre as suas cinco congêneres estaduais, que construiu e mantém, integralmente, um espaço cultural do porte do Museu da Gente Sergipana, cujo acesso é gratuito em decorrência do subsídio econômico aportado pelo Banco.
JLPolítica - Qual é o saldo, descontados os quase dois anos da pandemia do coronavírus, dos 10 anos do Museu da Gente Sergipana a serem completados agora em novembro?
ED - O processo de concepção e construção do Museu foi marcado pela vontade e pela empolgação de Marcelo Déda, e a determinação e a presença de João Andrade, então presidente do Banese. Não raro, as reuniões de alinhamento e de tomada de decisões eram notórias e a expressão do orgulho de ser sergipano, da necessidade de oferecer ao povo de Sergipe um espaço de celebração e fortalecimento da sergipanidade, ainda latente e contida. Durante os 10 anos de existência, podemos afirmar que o Museu ultrapassou as expectativas, transformando-se na casa que nos apresenta e representa, referência para os programas educativos dos estudantes sergipanos, além de estar inserido e consolidado no roteiro turístico principal do Estado. Desse modo, são vários prêmios recebidos, locais e nacionais. Entretanto, é importante evidenciar que o Museu não foi apenas um espaço novidadeiro inicialmente - ele se mantém sempre como uma alternativa pulsante de cultura, até pela diversidade e frequência de programas multidisciplinares.
JLPolítica - Mas ele não sofreu demasiadamente na pandemia?
ED - Mesmo durante a pandemia, o Museu não perdeu o contato com os que o procuravam. Lançamos a plataforma de visita virtual, fizemos três editais para os artistas, lançamos a plataforma Espie a Gente e realizamos programas memoráveis com a TV Sergipe e a TV Atalaia, mantendo a tradição dos festejos juninos, natalinos e carnavalescos. Para tanto, contamos com uma equipe que soube se reinventar. Foi, sem dúvida, o trabalho dos exímios profissionais, capacitados e comprometidos, com alma e brilho nos olhos, que atuam com empolgação e dedicação para manter e oferecer aos sergipanos e aos que nos visitam, desde a sua fundação, um equipamento destacado pela qualidade e estrutura organizacional e técnica, pilares de um serviço reconhecido nacionalmente.
ÊXITO DA PLATAFORMA PRÓPRIA ESPIA A GENTE
“Com um milhão de acessos em apenas três meses de seu lançamento, a plataforma serve também como instrumento educativo, pois é utilizada como conteúdo para aulas online pelas escolas das redes pública e particular. No último São João conseguimos criar e materializar uma produção audiovisual histórica”
JLPolítica - O senhor consegue ter uma noção da média de visitantes do Museu da Gente Sergipana por ano?
ED - A média anual de visitantes do Museu da Gente Sergipana Governador Marcelo Déda é de 86 mil pessoas.
JLPolítica - É possível aferir os perfis sociais e os locais de origem dos visitantes do Museu da Gente Sergipana?
ED - Mesmo possuindo o acesso gratuito, existe um cadastro na bilheteria para que possamos conhecer informações básicas e necessárias sobre o público visitante. Esses dados são importantes como instrumento de gestão e para balizamento de campanhas e projetos.
O público do Museu é identificado em três categorias: - estudantes dos mais diversos níveis de ensino, da educação infantil ao ensino superior; - turistas; - grupos assistidos por entidades e equipamentos da Assistência Social e da Saúde. Mas também é realizada a identificação do local de origem de todo o público, apurando se é de Sergipe, de outro Estado da Federação, ou se é estrangeiro.
JLPolítica - Este museu foi inaugurado em novembro de 2011 sob o signo de uma extrema modernidade. Ele evoluiu, nesse sentido, ou estacionou nesses 10 anos?
ED - O Museu evoluiu e se reinventou. Durante a pandemia, a estrutura tecnológica foi completamente atualizada, e com a inserção constante de novos conteúdos gerados através de exposições e de demandas que observamos no decorrer das atividades educativas desenvolvidas. Igualmente, verificamos que a quantidade de conteúdos gerados através de projetos do Instituto Banese e do Museu da Gente Sergipana necessitavam estar disponíveis e organizados para acesso público e irrestrito, então criamos uma plataforma digital própria - www.espieagente.com.br -, que possui mais de 300 produções audiovisuais oriundas de editais, apresentações artísticas e programas especiais de TV realizados pelo Instituto e empresas parceiras, a exemplo da TV Sergipe e TV Atalaia. A Plataforma de Visita Virtual é outro projeto assertivo e que mostra que o Museu está concatenado com as transformações e avanços tecnológicos no mundo. A plataforma foi construída seguindo exemplos como o Museu Van Gogh, em Amsterdã, e o Museu de Frida Kahlo, na Cidade do México.
DOS OBJETIVOS E FINALIDADES DO ÁGORA
“A multidisciplinaridade é predominante no Ágora Arquitetos, cuja atuação tem se destacado pelo desenvolvimento de projetos proativos, criativos, inovadores, tecnológicos, mantendo a relação custo/benefício, assegurando o respeito e a preservação da cultura e a sustentabilidade socioambiental”
JLPolítica - E o acesso é convincente?
ED - Sim. Com um milhão de acessos em apenas três meses de seu lançamento, a plataforma serve também como instrumento educativo, pois é utilizada como conteúdo para aulas online pelas escolas das redes pública e particular. No último São João, conseguimos criar e materializar uma produção audiovisual histórica que foi transmitida pela TV Sergipe - “São João da Gente Sergipana – Nós e Eles para Sempre” -, mesclando apresentações de artistas presenciais e virtuais, que culminou com a exibição do holograma de Luiz Gonzaga interagindo com a cantora Amorosa. Além da inventividade, a realização desse projeto exigiu muita competência técnica dos profissionais envolvidos, destaco aqui o brilhantismo e talento de Álvaro da Brasil Filmes, de Dudu Prudente e de Lucas Campelo, que fizeram a edição de áudio. Dividimos a direção com o jornalista e comunicador Pascoal Maynard, contando com o engajamento da equipe do Instituto Banese, fornecedores e apoiadores envolvidos. O resultado final foi a concretização de um programa verdadeiro, emocionante e histórico, que pode ser assistido através da nossa Plataforma Espie a Gente ou da Globoplay.
JLPolítica - De toda a massa de visitas virtuais a ele nesse período, o senhor acha que algo será incorporado para sempre a uma realidade virtual futura?
ED - As plataformas de visita virtual e a “Espie a Gente” permanecerão e terão incorporados novos conteúdos de projetos futuros. O modelo híbrido, mesclando experiências presenciais e virtuais, já é uma realidade - diante disso, as instalações do Museu também possuirão QR Codes, permitindo que o visitante possa acessar os conteúdos sem ter que tocar nos equipamentos. Disponibilizamos ainda uma nova plataforma de agendamento - ingressos.museudagentesergipana.com.br - para grupos de visitantes, evitando a aglomeração e garantindo a segurança de todos.
JLPolítica - Os projetos piloto e aplicado ao Museu da Gente Sergipana já renderam alguma premiação ao Escritório Ágora, comandado pelo senhor?
ED - Sim. Recebemos o prêmio “O Melhor da Arquitetura Brasileira 2012”, na categoria de Restauro. O concurso foi promovido pela Editora Abril, através da Revista Arquitetura & Construção. A premiação ocorreu no Memorial da América Latina, em São Paulo.
MEMORIAL PARA DONA CANÔ QUE NÃO AVANÇOU
“Após o falecimento de Dona Canô, em dezembro de 2012, a família sentiu a necessidade de fazer um Memorial. Desenvolvi o projeto que foi apresentado à família Telles Velloso, com as participações de Caetano, Bethânia e Paula Lavigne. Mas a pandemia atrapalhou o processo que poderá ser retomado”
JLPolítica - O que significa e como é a estrutura do Ágora?
ED - O Ágora Arquitetos foi criado para disponibilizar e realizar projetos multidisciplinares, envolvendo diversos segmentos do processo criativo. A matriz conceitual do escritório fundamenta-se na gênese da Ágora - expressão máxima da esfera pública na urbanística grega, sendo o espaço por excelência da cultura e da política na vida social da cidade-estado. A multidisciplinaridade é predominante no Ágora Arquitetos, cuja atuação no mercado tem se destacado pelo desenvolvimento de projetos proativos, criativos, inovadores, tecnológicos, mantendo a relação custo/benefício, assegurando o respeito e a preservação da cultura e a sustentabilidade socioambiental. Trata-se de um laboratório de soluções integradas em projetos de arte e arquitetura, notadamente abrangendo os segmentos de urbanismo, paisagismo, arquitetura, ambientação, design, restauro e retrofit, em museus, exposições e projetos culturais. O Ágora atua na concepção de projetos em todas as escalas, propondo soluções balizadas em experiências próprias e em pesquisas realizadas pela equipe permanente, ou por especialistas contratados para fins específicos.
JLPolítica - Como é constituída a equipe dele?
ED - A equipe do Ágora é constituída por profissionais formados em diferentes escolas do país e vem desenvolvendo projetos de reconhecimento público e notória qualidade. O escritório se caracteriza pela prospecção e proposição de projetos inovadores, atuando em demandas particulares, públicas e institucionais de pequeno, médio e grande porte.
JLPolítica - Como é que foram as suas experiências em projetos idênticos no Acre e nos Estados Unidos, via a cidade de Boston?
ED - No Acre, o Ágora desenvolveu o projeto do “Museu dos Povos Acreanos” - primeiro museu em multimídia interativa da região Norte, um equipamento de educação, cultura e turismo voltado para expor a diversidade de um Estado sui generis. Constituído a partir de diferentes processos de miscigenação, traços antropológicos e culturais muito peculiares, o Acre enfrentou questões políticas em sua formação territorial envolvendo a definição das fronteiras com Peru e Bolívia, além da extraordinária e exuberante biodiversidade amazônica, a ser exposta no Museu. Atualmente a obra se encontra em estágio de acabamento das instalações físicas, com finalização prevista para dezembro próximo, quando deverá ser iniciada a fase de estruturação e montagem expográfica. Para a realização desse complexo e desafiador projeto, foram feitas muitas e vastas viagens pelo território acreano, com imersões na floresta amazônica - uma experiência espiritual e multissensorial indescritível e necessária para encontrar a forma mais verossímil e inteira para contar a história. Em Boston, a convite da família Uchôa, fizemos o projeto do Tiradentes Institute, na Universidade de Massachusetts, um espaço para intercâmbio entre as instituições e voltado para apresentar Sergipe pelo viés da cultura e identidade. Inaugurado em 2017, tornou-se uma experiência muito importante para o Ágora, por ser um projeto internacional, com peculiaridades construtivas, legais e técnicas locais - interagindo com profissionais e fornecedores estrangeiros.
DA IMPORTÂNCIA DO LARGO DA GENTE SERGIPANA
“Sempre acreditei que havia algo naquele lugar pedindo para existir e minha tradução não foi equivocada. Está incorporado ao cotidiano da cidade, presente nas referências simbólicas de nossa sergipanidade. Entendo plenamente o princípio do contraditório e da crítica, mas o que precisa nascer e é grande suscita sempre sentimentos adversos”
JLPolítica - A família Veloso não avançou sobre a possibilidade de o senhor realizar na Bahia um Memorial a Dona Canô, como chegaram a idealizar?
ED - Vivenciei uma relação muito afetiva com Dona Canô, que esteve em Aracaju em 2001 para o lançamento do meu primeiro livro, “Árvore de Folhas Caducas”, prefaciado por Maria Bethânia. Posteriormente, em 2010, Dona Canô também participou do DVD de meu livro “A Casa das Ausências”, interpretando um texto de minha autoria. Em um dos shows de Bethânia em Aracaju, a família conheceu o Museu da Gente Sergipana, oportunidade em que ficou encantada com o equipamento e suas possibilidades. Após o falecimento de Dona Canô, em dezembro de 2012, a família sentiu a necessidade de fazer um Memorial. Desenvolvi o projeto que foi apresentado à família Telles Velloso, com as participações de Caetano, Bethânia e Paula Lavigne. Mas a pandemia atrapalhou o processo que poderá ser retomado.
JLPolítica - Sua amizade com a cantora Maria Bethânia continua ou se perdeu?
ED - Não posso dizer que somos amigos, mas temos afinidades no gosto pela poesia e nos aproximamos por causa disso. Ela prefaciou meu primeiro livro “Árvore de Folhas Caducas”, em 2001, cujo apoio e incentivo foi importante no momento em que iniciava minha caminhada como escritor. Em 2019, desenvolvi um projeto inédito sobre Mãe Menininha do Gantois, e mais uma vez Bethânia abraçou a ideia e me levou ao Gantois para ser recebido por Mãe Carmem e família. Tenho com ela uma relação de deferência, inspiração, respeito, consideração e gratidão absoluta.
JLPolítica - Como é que o senhor atravessou a avalanche de críticas de setores da vida de Sergipe à fixação das figuras da cultura do Estado no Largo da Gente Sergipana?
ED - Atravessei serenamente e de tototó (risos). Sempre tive a lucidez e a plena convicção das polêmicas e incômodos que uma intervenção artística e urbana desse porte causaria, acrescentando a temática da cultura popular sergipana, pouco conhecida e ignorada por alguns, o local simbólico e de grande visibilidade na paisagem natural da cidade, e o momento político daquela época. Mas o governador de então, Jackson Barreto, teve a coragem de erguer e viabilizar a obra que hoje está incorporada ao cotidiano da cidade, presente nas referências simbólicas de nossa sergipanidade através dos diversos meios de comunicação, publicidade e propaganda, no artesanato, nas artes visuais. Recentemente, o artista plástico Tintiliano me confidenciou que o Largo da Gente Sergipana é a maior demanda de encomendas que ele recebe. O Largo se destaca em produções audiovisuais, em conteúdos de provas e gincanas, em livros escolares, além da profusão de imagens e divulgação nas selfies que se propagam pelas redes sociais. Enfim, sempre acreditei que havia algo naquele lugar pedindo para existir e minha tradução não foi equivocada. Entendo plenamente o princípio do contraditório e da crítica, mas o que precisa nascer e é grande suscita sempre sentimentos adversos.
O ITINERÁRIO DO PROJETAR.SE
“O Projetar.SE tem como meta atender todos os municípios sergipanos com projetos que sejam considerados estratégicos do ponto de vista social e econômico. Há diversas frentes, então há municípios que estão tendo seu projeto prioritário elaborado, outros que estão recebendo assessoria para obras paralisadas”
JLPolítica - Mas a sua gestão e o Museu da Gente Sergipana têm como objetivo medir a performance do Largo da Gente Sergipana no capítulo visitação?
ED - Após a inauguração do Largo, em 2018, houve uma imediata integração com o fluxo de visitação do Museu – como já tinha sido previsto desde a época do desenvolvimento do projeto e, um considerável aumento de público visitando o Museu. São equipamentos culturais que se completam e, mesmo durante o período em que o Museu esteve fechado, o fluxo de visitas ao Largo continuou.
JLPolítica - Na sua visão, Sergipe não seria meio somítico e avaro na montagem de monumentos e equipamentos simbólicos que revelam o peso e a importância da história do Estado aos próprios sergipanos e aos que o visitam?
ED - Indubitavelmente. Mas vejo movimentos favoráveis nesse sentido, por parte do poder público e da iniciativa privada. Percebeu-se que a sergipanidade é um ativo com grande potencial de retorno. O Museu da Gente Sergipana e o Instituto Banese cumprem o papel de conscientização importante no despertar para o pertencimento.
JLPolítica - Qual é a importância que o Projetar.SE tem e terá para um bom desempenho dos governos municipais de Sergipe?
ED - O Projetar.SE vem suprir uma lacuna histórica nas gestões municipais que compreende desde o sonho de um gestor em atender uma demanda da população através de uma obra pública, até a execução final dessa obra. Entre um desejo e a conclusão de uma obra pública, há um burocrático e complexo fluxo de elaboração completa e integrada de projetos e orçamentos coerentes com a realidade de mercado, além de providências dos processos de aprovações e autorizações de órgãos competentes, e um criterioso acompanhamento de execução de obras. A grande maioria das prefeituras de municípios sergipanos não contam com um aporte financeiro capaz de manter uma estrutura e pessoal técnico capacitado para todas estas demandas, acarretando muitas vezes em perdas de recursos e não realização de suas obras.
O Projetar.SE promove a elaboração de projetos estratégicos para os municípios e a assessoria às prefeituras em diversas frentes de atuação. Além disso, fomenta ainda a valorização, a formação e o fortalecimento das competências locais, com o acompanhamento, a troca de informações e o auxílio aos profissionais de arquitetura e engenharia das prefeituras. Um trabalho que promove a cultura do planejamento e da inovação, tão necessária ao bom desempenho da gestão pública dos governos municipais, de forma a garantir que os recursos captados ou a serem captados sejam de fato aplicados, promovendo serviços públicos de melhor qualidade, beneficiando a vida das comunidades, e gerando desenvolvimento para todos os municípios sergipanos.
QUE POETA BISSEXTO O QUÊ!
“Não gosto de categorizações. Escrevo quando tenho vontade e sem pretensões obrigatórias de publicar. Meus dois livros nasceram de necessidades momentâneas, mas só os publiquei quando foram vistos sob o olhar da qualidade literária. Em ambos mesclei linguagens artísticas que complementam a escrita - sempre gostei desse diálogo e interação com outras searas”
JLPolítica - O Projetar.SE tem metas a serem seguidas e batidas em seu cronograma?
ED - O Projetar.SE tem como meta atender todos os municípios sergipanos com projetos que sejam considerados estratégicos do ponto de vista social e econômico. Há diversas frentes, então há municípios que estão tendo seu projeto prioritário elaborado, outros que estão recebendo assessoria para obras paralisadas, e alguns que vão começar agora em novembro a receber formação na área de arquitetura e urbanismo voltada ao setor público. Cada projeto tem uma complexidade diferente, então há tempos específicos de elaboração, que podem ser de três meses a 10 meses, englobando aí todas as peças técnicas e as licenças necessárias, que podem sair rápido ou não. Para cada município que recebemos, há uma compreensão do objeto escolhido, um reconhecimento de área, um levantamento de dados, estudos de viabilidade, até serem traçadas as diretrizes de projeto e a elaboração do projeto propriamente dito. Cada caso é um caso. Então os cronogramas são dinâmicos. Fazemos um planejamento que vai se readequando ao longo do tempo em função da realidade posta.
JLPolítica - Há planejamento de quantidades de municípios a serem atendidos em determinados períodos?
ED - A estimativa da meta é que a cada 6 meses possam ser contemplados 8 municípios - mas isso depende da complexidade dos projetos e de cada situação específica. O fato é que as gestões que estão sendo atendidas vão começando a compreender esta complexidade, sendo sensibilizadas para a necessidade de se fazer projetos que atendam a todos os critérios e normativos técnicos, consequentemente percebem que projetos rápidos e malfeitos provocam paralisação ou não execução de obras, além da devolução de recursos preciosos para suas populações. Este é um legado importante que trazemos como meta principal em nossa missão.
JLPolítica - O Projetar.SE é um programa do Banese ou do Instituto Banese?
ED - É um programa do Banese e do Governo do Estado, realizado através do Instituto Banese.
O QUE DIZER DA ARQUITETURA SERGIPANA
“A Faculdade de Arquitetura é um fato ainda muito recente, possui pouco mais de 20 anos. É preciso mais tempo para que se possa analisar melhor e com mais assertividade se realmente existe um conceito arquitetônico próprio em Sergipe”
JLPolítica - O senhor é um poeta bissexto? Por que só lançou até agora apenas dois livros de poemas?
ED - Não gosto de categorizações. Escrevo quando tenho vontade e sem pretensões obrigatórias de publicar. Meus dois livros nasceram de necessidades momentâneas, mas só os publiquei quando foram vistos sob o olhar da qualidade literária. Em ambos mesclei linguagens artísticas que complementam a escrita - sempre gostei desse diálogo e interação com outras searas. Entretanto, tenho desenvolvido diversos projetos de exposições, memoriais e museus que requerem uma visão multidisciplinar, através dos quais tenho tido a possibilidade de expor meu universo criativo sem estar preso a impossibilidades aparentes. Gosto do desafio, do vasto, do que inquieta e questiona. Mas, sobretudo, precisa ser verdadeiro e ter emoção - seja através da escrita, da arquitetura, de uma exposição, de uma produção audiovisual ou qualquer outra forma de expressão.
JLPolítica - Quais foram as performances e abrangências de “Árvore de Folhas Caducas” e “A Casa das Ausências”?
ED - “Árvore de Folhas Caducas”, de 2001, foi uma produção local e teve boa receptividade e aceitação. De certa forma, foi uma base estruturante para que eu conseguisse realizar “A Casa das Ausências”, de 2010, publicado e distribuído nacionalmente pela Editora 7 Letras, obra que possui um livro com um DVD contendo textos interpretados por Antonio Abujamra, Clifton Davis, Expedita Ferreira, Dona Canô, Jorge Mautner, Jorge Vercillo, Jota Velloso, Mabel Velloso, Maitê Proença, Tereza Rachel e Zélia Duncan - que também gravou a trilha sonora do clip. Contei também com a participação da trilogia genial de meus ilustres familiares Artur Déda, Harildo Déda e Marcelo Déda. “A Casa das Ausências” também me trouxe o reconhecimento de Moacyr Scliar.
JLPolítica - Como anda a sua produção de poemas? Vem livro novo por aí?
ED - Rarefeita. Sem perspectiva de um novo livro por enquanto, mas com muitos outros projetos em andamento.
www.espieagente.com.br
“Verificamos que a quantidade de conteúdos gerados através de projetos do Instituto Banese e do Museu da Gente Sergipana necessitavam estar disponíveis e organizados para acesso público e irrestrito, então criamos uma plataforma digital própria”
JLPolítica - O Instituto Banese não foi de certo modo omisso ao consentir que a Secretaria de Estado da Cultura de Sergipe acabasse com os Prêmios Santo Sousa e Núbia Marques, de poesia e de contos?
ED - O Instituto Banese não possui nenhuma ingerência sobre as ações adotadas por órgãos do Executivo estadual.
JLPolítica - O senhor se dá por contente com a interface entre o Museu da Gente Sergipana e as artes plásticas sergipanas? Não acha que deveria haver uma interação melhor?
ED - O Museu da Gente Sergipana é um equipamento etnográfico que utiliza recursos tecnológicos para expor o patrimônio cultural material e imaterial do Estado. Não é uma galeria de exposições. Entretanto, existem instalações permanentes que homenageiam artistas sergipanos, como os grandes painéis de pintura em cerâmica presentes no muro do estacionamento do museu e do deck do café. Há esculturas de Cruz e de Elias Santos, obras de Véio, entre outras presentes no acervo do Museu e do Instituto Banese. Estamos desenvolvendo um projeto previsto para dezembro, que abordará o tema das artes visuais sergipanas de forma inovadora e sensorial.
JLPolítica - Qual é o seu conceito da arquitetura praticada atualmente em Sergipe? Algo lhe chama a atenção?
ED - A Faculdade de Arquitetura é um fato ainda muito recente, possui pouco mais de 20 anos. É preciso mais tempo para que se possa analisar melhor e com mais assertividade se realmente existe um conceito arquitetônico próprio em Sergipe. O que posso dizer com clareza é que o curso de Arquitetura mudou o panorama de nossas cidades, os padrões de consumo e a paisagem urbana. Vejo colegas de profissão, criativos e exercendo o papel com maestria, desde os nossos notáveis veteranos até a nova geração. Mas acho que é necessário buscar estruturar melhor os projetos em sua base conceitual, fundamentação, lastro - são elementos indispensáveis para se encontrar a alma do espaço edificado e do vazio encerrado por ele.
FONTE: JL POLÍTICA
ANO: 30 de outubro de 2021