A povoação do “Berço da Cultura Sergipana” seguiu a concepção urbanística ibérica, tendo como referência à devoção a Nossa Senhora de Guadalupe e utilizou o local mais elevado para deflagrar o processo.
A edificação da ermida, em homenagem à Virgem Indígena, na atual Praça Barão do Rio Branco, foi uma sugestão de Mércia Cardoso, esposa de Pedro Homem da Costa. O local se tornou o marco zero da cidade - o ponto de partida da estancianidade.
Corria o século XVII e a partir de então toda a vida urbana de Estância se inspirou nesse núcleo originário que, diga-se de passagem, é fundamental para a construção da identidade histórico-arquitetônica.
A Praça Barão do Rio Branco é composta por três jardins, sendo do lado direito da Catedral Diocesana: o Dom Coutinho; lado esquerdo: o Monsenhor Vitorino; e defronte: o Dom Pedro II. Ela alimenta as lutas e os sonhos da sociedade estanciana.
É bem verdade que o conjunto arquitetônico da “Cidade Jardim de Sergipe” tem sofrido um processo de descaracterização a olhos vistos, com prejuízos irreparáveis, com a destruição de um sem número de casarios de azulejos europeus, especialmente os portugueses.
Certamente a ausência de políticas públicas de preservação, como resultado da atuação de gestores e gestoras cada vez mais alheios a essa realidade tem contribuído sobremaneira para esse cenário de perda identitária.
E com a globalização do mundo contemporâneo, uma outra dificuldade palpável e até perigosa, impõe-se, que é a tentativa de homogeneização da vida nos seus diversos aspectos.
Todavia, a cidade precisa de sua identidade histórico-cultural para seguir adiante e dialogar com a memória, que é ferramenta essencial para o alcance da cidadania. Sem ela, será fatalmente atropelada por modismos rasos e pseudo-modernismos, que em nada contribuem com o seu desenvolvimento, pelo contrário, deformam-na.
Nessa perspectiva, os atuais gestores municipais - prefeito Gilson Andrade e o vice André Graça estão reformando a praça Barão do Rio Branco numa obra interminável, que tem criado uma série de transtornos para a população, a qual precisa acessar a parte central da cidade, principalmente os/as comerciantes, que têm que conviver em espaços limitados e com a sujeira de restos de material de construção.
A situação da mobilidade urbana, que já não era boa na região, ultimamente tem sido caótica, sobretudo nos horários de maior movimentação de transeuntes e veículos, atrapalhando assim a fluidez do trânsito e as atividades comerciais.
Convém registrar que a obra que já perdeu todos os prazos estipulados (a previsão era de 06/05/2022 a 06/11/2022) custará ao erário cerca de 2.755.000,79 (dois milhões setecentos e cinquenta e cinco mil reais e setenta e nove centavos) um valor bastante significativo.Todavia, o mais grave tem sido a falta de diálogo com a sociedade, o que poderá levar a tão propalada reforma a descaracterizar ainda mais a principal praça estanciana.
E se isso vier acontecer seria um crime de lesa-identidade municipal e feriria de morte a história de um espaço geográfico tão caro à estancianidade, que Nossa Senhora de Guadalupe nos livre da estupidez e de uma concepção de obra pública rasa e a serviço da desmemória.
José Domingos Machado Soares (Dominguinhos)
Professor e ex-vereador de Estância