Por Igor Salmeron
Na história da seara jornalística sergipana, poucas vezes se viu uma carreira tão longeva como é o notório caso de Ivan Valença. Homem que prezou pelo profissionalismo e estilo único. Autodidata, é personagem essencial que elucida o crescimento do jornalismo tanto em Sergipe quanto além-fronteiras.
Conhecido como a prata da casa, Ivan Valença possui mirífica caminhada traçada por esforço de auto aprendizado e experiências vivazes. Mais de seis décadas o caracterizam profissionalmente. Multifacetado, bosquejou pelo cativante universo da sétima arte, nos presenteando com críticas cinéfilas bem embasadas. Sua astúcia vai muito além, Valença é daqueles que se interessam pelo intenso, pela reflexão ruminante. Podemos localizá-lo sociologicamente na primeira geração de jornalistas profissionais sergipanos.
Nasceu em Aracaju no ano de 1944, de família privilegiada gozou de boas condições desde a tenra idade. Seu pai era um empresário renomado na área funerária o que lhe trazia uma base familiar bem estruturada. Desfrutou de lúdica adolescência, sendo que aos 13 anos já era frequentador assíduo das matinês dos cinemas aracajuanos. Dotado por cristalino talento de saber traduzir seus encantamentos imagéticos em palavras, publicava impecáveis textos sobre impressões cinéfilas em jornais da época auferida.
Suas primeiras “críticas de cinema” foram lançadas no ano de 1957 no Sergipe Jornal, no Diário de Sergipe bem como no clássico Gazeta de Sergipe. Nessa mesma época, Valença acabou sendo contratado para fazer parte de uma equipe de jornalistas do período que marcou a transição da Gazeta de Sergipe com a responsabilidade de tomar notas sobre todas as notícias que chegassem por telefone ou informantes ao jornal, função esta que abandonou algumas semanas depois por não ter recebido o valor combinado. Podemos notar que Valença se profissionalizou nessa estação investigada.
Passado alguns meses, Valença foi recontratado como repórter deste mesmo veículo de comunicação dedicando-se a cobrir acaloradas sessões da Câmara de Vereadores de Aracaju e, depois, as da Assembleia Legislativa de Sergipe, com a missão de elaborar matérias diárias para o jornal. Neste impresso, Ivan Valença atuou até o ano de 1982 chegando pela sua irrefreável dedicação a ocupar posições de redator e diretor. Sua inserção no jornalismo foi além: No ano de 1971 foi um dos sócios-fundadores do tradicional Jornal da Cidade ao lado do lendário empresário Nazário Pimentel, inicialmente semanal, depois diário, em off-set.
No finalzinho dos anos 1970 fundou a Gráfica “Composição Editora e Publicidade LTDA” dedicada à edição e jornais alternativos. Nos anos 1980 marcou época quando esteve no Jornal Cinform e Folha da Praia. Foi entusiasta colaborador do Jornal da Cidade e do Portal Infonet. Referência indiscutível de credibilidade e competência, prestou assessoria a importantes entidades como a Associação Comercial de Sergipe e colaborou para o antigo Programa de Rosalvo Nogueira na Rádio Jovem Pan.
No cinema, Valença assinala seu nome com devida altivez. Pesquisador entusiasta da temática, foi catalogador dos mais admiráveis. Ao longo de tantos anos, foi mantenedor de um dos maiores acervos sobre obras cinematográficas do Brasil. Herdou sua paixão fílmica através dos genes maternos, pois costumava ir para as matinês com ela no mítico Cinema Rio Branco ou no Cinema Vitória, registrando-se que nesse tempo as mulheres pagavam menos e as crianças entravam de graça.
Chaplin, Mature, Marlon Brando e/ou Tyrone Power são só alguns gloriosos nomes que sempre o encantava. Chegou a ir durante os anos de 1974, 1976 e 1978 ao aclamado Festival de Cannes inscrito como jornalista internacional além da Mostra de Cinema de Milão. Para quem não sabe, Valença entrevistou François Truffaut, um dos maiores diretores que marcaram a áurea época da nouvelle vague francesa. Trouxe consigo novas ideias de lá, tanto é que teve a brilhante epifania de criar um pioneiro videoclube em terras sergipanas.
Ao pesquisar sobre o cine clubismo, observou-se que surgiu no Rio de Janeiro no ano 1928. Aqui em Sergipe, chegou na década de 1950 com notáveis nomes como Alberto Carvalho e Tertuliano Azevedo. Eles criaram o Cine Clube aracajuano que fazia suas exibições no eminente auditório do Instituto Histórico e Geográfico sergipano. Valença frequentou algumas sessões e percebeu a relevância que teve esse Cine Clube no contexto cultural local no sentido de que se exibiam filmes que não chegavam comercialmente em Aracaju, por exemplo, uma ótima película de Clouzot chamada “O salário do medo”.
O videoclube de Valença surgiu no ano de 1981, logo após ter adquirido um vídeo cassete, juntou alguns amigos e começou a encomendar fitas de São Paulo. Uma regra para participar do clube era a de que tinham que ser entregues duas fitas para o acervo. O sucesso foi tanto que o videoclube havia começado com somente 20 fitas, mas até o seu fechamento, no ano de 1986, chegou à cifra de 7500 filmes. Nesse ano surgiu em Aracaju a célebre locadora de Ivan Valença que foi a desbravadora no segmento.
No aprazível seio doméstico, contraiu matrimônio com Ana Valença, que o acompanhava de perto nas empreitadas cinéfilas cuidando da locadora. Podemos dizer que o faraônico acervo de Valença já havia se iniciado quando ele contava 5 anos de idade acompanhado da mãe. Foi durante esse entremeio, que depois ele percebeu que a carreira de jornalismo seria o seu lema de vida. Leitor voraz, Ivan Valença costumava permanecer por horas lendo romances da literatura clássica, jornais e revistas de conteúdo dos mais variados.
Uma curiosidade: Quando Valença era pequeno, costumava ir com a mãe na feira do antigo Mercado Municipal. Ao invés de ficar ao lado dela, ficava com uma senhora que vendia sabão, pois ela embrulhava os sabões em jornais. E como ela acumulava uma pilha imensa de jornais nacionais, ele ficava lendo as publicações como, por exemplo, Jornal do Brasil, Jornal Carioca, Folha da Manhã, A Última Hora dentre outros.
Grandes foram e continuam sendo ícones desse tempo: Raymundo Luiz, Célio Nunes, Osório de Araújo Ramos, Hugo Costa, João Oliva Alves, Luiz Antônio Barreto, Alberto Carvalho, Jurandir Santos, Orlando Dantas, Joel Silveira, Ancelmo Góis, Zózimo Lima, Paulo Gomes Dantas, Ariosvaldo Figueiredo, Luduvice José, Paulo Lacerda, Osmário Santos dentre outros avultados.
Dentre variados prêmios, ganhou da Associação Comercial e Empresarial de Sergipe na categoria Líderes e Vencedores – categoria destaque profissional. Prova do seu vasto currículo, houve ainda tempo prolífico em que atuou como gestor nas pastas de Cultura do Estado e do Município.
Conclui-se que Ivan Valença permanecerá como sendo senão o, mas, com certeza, um dos grandes ícones do jornalismo sergipano. Um cara respeitado, de jeito atilado e com inteligência que se sobressalta por onde passa. O cinema o ensinou a desbravar os caminhos do bom jornalismo, me fazendo lembrar o genial crítico americano Roger Ebert, pois assim como ele, sabia como ninguém transitar por reflexões atemporais que nos faz acreditar no poder transformador da escrita na vida das pessoas.
Seu legado de honestidade e respeito pelos leitores perdura. Um dos seus maiores conselhos é: leia sempre, se informe de maneira contínua. Ao estudar sua respeitável trajetória, concluímos que a prosperidade social se consolida com base cultural bem estruturada. Eis Ivan Valença, esse escriba de personalidade ímpar que engrandece nosso fascinante Estado de Sergipe!
¹ Texto escrito por Igor Salmeron, Sociólogo - Doutorando em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Sergipe (PPGS-UFS), com pesquisas financiadas pela FAPITEC/CAPES e faz parte do Laboratório de Estudos do Poder e da Política (LEPP-UFS). Membro vinculado à Academia Literocultural de Sergipe (ALCS) e ao Movimento Cultural Antônio Garcia Filho da Academia Sergipana de Letras (MAC/ASL). E-mail para contato: igorsalmeron_1993@hotmail.com