“A minha visão era que, se não fosse planta nativa, não tinha importância, mas hoje vejo que tem sim.” O relato da agricultora Cleonice dos Santos, 38 anos, mostra como a educação ambiental é uma das ações propulsoras para a preservação da natureza.
Moradora do assentamento Mandacaru, no município de Canindé do São Francisco, Alto Sertão de Sergipe, ela conta que a percepção sobre a biodiversidade do entorno da Caatinga mudou a partir da experiência no Projeto Convert – Conversação e Recuperação da Caatinga do Mona do São Francisco.
Há dois anos, a comunidade rural recebe a visita de um grupo de pesquisadores de Ciências Agrárias e da Terra da Universidade Federal de Sergipe (UFS). São professores, alunos e técnicos de Zootecnia, Engenharia Agronômica, Engenharia Florestal e Engenharia Agrícola dos campi de São Cristóvão e do Sertão, em Nossa Senhora da Glória.
A equipe multidisciplinar e interinstitucional trabalha na execução do plano de conservação e recuperação florestal de 600 mil m² de áreas degradadas de vegetação na região da Unidade de Conservação do Monumento Natural do Rio São Francisco.
Quem coordena o Projeto Convert é o professor de Zootecnica da UFS, Elias Carnelossi. Segundo ele, além de atividades de conscientização ambiental junto à comunidade, como a construção de um viveiro de mudas e o plantio de árvores nativas da Caatinga, o bioma é alvo de pesquisas científicas voltadas ao diagnóstico e caracterização do solo, flora e fauna da região.
A iniciativa no semiárido nordestino integra o Projeto GEF Terrestre – Estratégias de Conservação, Restauração e Manejo para a Biodiversidade da Caatinga, Pampa e Pantanal, desenvolvido pelo Ministério do Meio Ambiente.
Em Sergipe, a ação é executada pela UFS, por meio da Fapese (Fundação de Apoio à Pesquisa e Extensão de Sergipe), em parceria com o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), tendo financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
“Estamos trabalhando em um bioma com condições climáticas particulares e que está exclusivamente dentro do território nacional. São condições, às vezes, extremas para a sobrevivência humana, afinal de contas temos que considerar que há milhões de pessoas convivendo com essas condições adversas no semiárido,” ressalta Elias Carnelossi.
Restauração florestal
Somente a agricultora Cleonice dos Santos já realizou o plantio de 30 mudas de umbuzeiro, uma das árvores típicas da região. A estimativa, ao final de três anos de execução do projeto, segundo Carnelossi, é plantar 6 mil mudas nativas, doadas pela Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf).
O plano de restauração florestal também envolve a realização de experimentos que visam o enriquecimento ecológico da área diante da degradação provocada pela exploração da vegetação para fins agrícolas, pecuários e madeireiros, principalmente.
Um dos estudos em andamento consiste no plantio de 20 espécies nativas para recuperar uma determinada área. Nela, serão avaliadas três espécies: Pau-ferro, Mororó e Aroeira do Sertão. O objetivo é entender as respostas das plantas aos tratamentos aplicados no solo.
Recuperação de solos
Doutor em Solos e Nutrição de Plantas, o professor de Engenharia Agronômica da UFS, Thiago Garcez, atua no Projeto Convert no eixo de análises de solos quanto às características morfológicas, químicas e físicas. Ele revela que os primeiros estudos na área confirmaram a hipótese de que a degradação da vegetação está relacionada ao teor de matéria orgânica na terra.
“Por causa do solo descoberto devido a chuvas muito intensas em determinados períodos do ano, ocorre a erosão da camada superficial do solo, onde justamente está a matéria orgânica. Foi o que identificamos em algumas áreas analisadas comparando com áreas de vegetação preservada,” aponta o pesquisador.
O experimento montado com três espécies nativas será testado de duas formas, considerando a adubação do solo. “A ideia é avaliar se temos melhorias fazendo o barramento da água que escorre na superfície, e a adubação para ver se, aumentando um pouco mais o teor da matéria orgânica, vai favorecer o crescimento das espécies florestais,” justifica Thiago.
Para auxiliar as tomadas de decisão no plano de recuperação, os pesquisadores realizaram o mapeamento de áreas consideradas prioritárias por meio de geotecnologias e uso de imagens de drone na coleta, processamento, análise e disponibilização de informações geográficas.
A construção de mapas sobre o relevo e a declividade na região, por exemplo, possibilitou a elaboração do Plano de Manejo da Unidade de Conservação Mona do São Francisco. O documento inédito foi enviado ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Fonte: Ascom UFS