Após o Ministério Público de Sergipe (MP/SE) determinar a redução de um dia de feira livre no município de Estância, proprietários de bancas e também pessoas que trabalham no local estão revoltados com a situação. Esse é apenas o início de uma série de ações que já está acontecendo e deve causar ainda mais prejuízos para quem depende do comércio para sobreviver. O MP divulgou, no último dia 7 de março, um Auto Circunstanciado de uma inspeção que aconteceu na feira livre do município no dia 11 de novembro do ano passado. Nele, foram apontadas várias irregularidades, a exemplo da obstrução de vias, o não distanciamento entre as barracas e a exposição de produtos em calçadas.
Apesar dos últimos acontecimentos em torno da problemática, essa reclamação junto ao MP/SE não é de agora. Segundo informações dos feirantes, a provocação ao órgão aconteceu em novembro de 2020 e foi feita por apenas por um proprietário de uma loja específica. Além disso, o MP/SE comunicou aos feirantes que pretende ampliar o número de dias sem funcionamento da feira, neste caso, sairia de 1 dia para 3 dias com o comércio fechado no local. Outro ponto que tem sido motivo de grande questionamento dos trabalhadores diz respeito à ordem para que as bancas sejam montadas e desmontadas no mesmo dia, com os feirantes se responsabilizando em guardá-las.
Para Celso Mazê, que comercializa no espaço há 20 anos, as modificações devem elevar o número de desempregados em Estância. “Isso vai prejudicar o carregador que pega os caixotes da gente, que tem família para sustentar. E vai prejudicar uma funcionária que trabalha comigo na banca. Colocando essa feira para três dias, eu não vou ter condições de ficar com esses dois funcionários, vou ter que demitir, porque não têm condições deles trabalharem 12 dias no mês e eu ter que pagar o mês completo. A gente vive disso”, repudia o feirante.
Celso também ressaltou a importância de seis dias de feira, como sempre foi, para municípios vizinhos e povoados distantes da sede de Estância. “Sem contar que a feira de Estância abrange os municípios vizinhos. É Arauá, Umbaúba, Cristinápolis, todo mundo desce para Estância porque é o único lugar que tem feira todo dia. Aqui em Estância hoje você conta com, colocando por baixo, 10 pontos de táxis, cada um de uma colônia, das praias, do Porto do Mato, de Indiaroba, de Terra Caída, cada um de um lugar. Acabando essa feira nesses três dias, esse povo não vai vir todos os dias. Direta e indiretamente isso vai causar mais de 500 desempregos. Muita gente depende dessa feira”, acrescenta.
PANDEMIA
Quem também se diz bastante prejudicada é a feirante Lívia Batista. Segundo ela, os comerciantes ainda nem se recuperaram dos efeitos causados pela pandemia da Covid-19 e já têm que lidar com mais este problema. “Muitos ainda não conseguiram se equilibrar, tiveram dívidas, o comércio caiu, a gente ficou sem trabalhar, tudo por conta da pandemia. Alguns estão se recuperando agora para voltar a vida ao normal. Vai ficar muito em falta. Acredito que não só para nós comerciantes, mas para os carregadores. Têm pessoas que o comércio é um pouco maior e precisam de ajudante na barraca. Têm muitos que colocam os colaboradores para pagar recebendo diária, tudo isso é uma geração de emprego informal, mas serve para quem não tem nada. O ruim é fechar as portas de onde está produzindo, acontecendo”, ressalta.
Lívia afirma não ter outra atividade para levar o sustento à família. “Nasci no comércio, sou filha de comerciante, minha mãe se aposentou e a gente herdou isso dela. Quem nunca estudou para ser um doutor da vida, mas eu me encontrei nesse comércio. Me realizei, casei, tive a minha filha e sobrevivo do meu comércio. Não sei fazer outra coisa. 90% de nós não temos outra renda. Os nossos filhos se formam, se profissionalizam, fazem cursos e cadê o emprego? A gente quer colocar os nossos filhos em um mercado de trabalho e não encontra”, desabafa.
A feirante vai mais além e elenca que o funcionamento dos seis dias de feira livre não é positivo apenas para o feirante, mas para toda a cadeia produtiva na cidade de Estância. “Ela funciona todos os dias porque tem capacidade para isso, não é uma feira que atende somente os moradores daqui. A gente atende também os moradores da região, das cidades circunvizinhas. Todos nós ganhamos, não apenas os feirantes. Ganha o comerciário, o lojista, porque se a feira não acontece, muitos desses que vêm de suas cidades não irão vir nos dias em que a feira não acontece. O comércio de Estância como um todo depende da feira e das pessoas que ela atrai. Essa decisão tem que ser revista com muito cuidado e cautela, porque nós somos seres humanos, trabalhadores e estamos aqui há muitos anos e a feira de Estância acontece há décadas”, diz Lívia.
Já Ismael de Souza, possui 34 anos de feira e 19 deles dedicados à montagem de bancas. O profissional afirma que nunca passou por uma situação parecida e que está muito cansado devido à obrigatoriedade de montar e desmontar as bancas diariamente. “Eu nunca vi uma situação como essa aqui em Estância. Monto banca para muito feirante e com um valor mais abaixo porque sei que todo mundo precisa, mas depois dessa determinação de desmontar todos os dias, não tive mais sossego, já perdi quatro quilos. Não somos bandidos e estamos aqui para ganhar o nosso pão e a Prefeitura não enxerga isso. Claro que não é para ser desorganizado, mas é preciso olhar por nós. Isso é desumano e os fiscais não estão na nossa pele para saber o que estamos passando”, lamenta.
A feirante Cosmira Lima cobra apoio da Prefeitura de Estância em relação à feira, mas se diz decepcionada com a atuação do gestor Gilson de Andrade. “Estou muito arrependida de ter votado nesse prefeito. O que mais me dói é que ele veio aqui, olhou nos meus olhos e disse que não ia desamparar os feirantes. Tantos outros problemas que Estância passa, mas parece que só sabem olhar para o que a feira causa. Não enxergam que existem inúmeros pais e mães de família que dependem do que ganha aqui. Não enxergam os pobres dos montadores de banca que se desdobram para montar e desmontar todos os dias. Isso é uma vergonha para o município de Estância. Nunca aconteceu isso em nenhuma gestão, nem de Ivan Leite, nem de Carlos Magno, de ninguém. Outra coisa, existe um projeto para a feira e eles não realizam porquê? Se arrasta de gestão em gestão, mas é muito mais fácil penalizar a parte mais fraca”, finalizou.
RESPOSTAS
Esta semana, um grupo de feirantes procurou a Promotoria de Estância para buscar o diálogo e fazer suas ponderações, na tentativa de que essa situação seja revista pelo MP/SE. Além disso, eles redigiram um documento elencando as reivindicações e sugerindo formas de atuação por parte da Prefeitura de Estância. O JORNAL DA CIDADE procurou o Ministério Público para falar sobre o caso, mas a Dra. Cecília avisou, através da sua Assessoria de Comunicação, que por enquanto não vai conceder entrevista e ficou de passar o número do procedimento para a reportagem acompanhar. Até o fechamento desta edição nada foi passado.
O prefeito de Estância, Gilson Andrade, também foi procurado pela equipe do JC MUNICÍPIOS, para falar sobre o caso e explicar o que a prefeitura tem feito nesse impasse. A Assessoria de Comunicação garantiu que enviaria as respostas, porém nenhuma questão foi respondida.
Fonte: Jornal da Cidade