Nesse mês de novembro um dos filhos mais ilustres de Sergipe comemorou aniversário, mais exatamente no último dia 18. Aos 79 anos, já que é do ano de 1942, o professor, escritor, jurista, advogado, magistrado, poeta e político brasileiro Carlos Augusto Ayres de Freitas Britto é nome que permanecerá no panteão dos inolvidáveis na História do Brasil. O garoto esbelto e inteligente desde tenra idade, nasceu em Propriá, histórico município sergipano amplamente conhecido como a Princesinha do Rio São Francisco.
Este local é minadouro de muitos personagens notáveis, e foi lá que sempre encontrou as suas mais melífluas inspirações. Diz-se que aos treze anos de idade já era inclinado para a ambiência poética, donde ficava embevecido pelas margens do ‘Nilo brasileiro’. Não poderíamos falar de Ayres Britto sem trazer à baila também a bela trajetória do seu saudoso e respeitado pai, Dr. João Fernandes de Britto. Ao fazer levantamentos sobre sua amável figura paterna, observamos que nasceu num dia 11 de fevereiro do ano 1910.
Era filho de João Fernandes de Seixas Britto, conhecido como Sr. Britto e de Dona Maria da Glória de Seixas Britto. Sua esposa chamava-se Dona Dalva Ayres de Freitas Britto, que foi uma aplicada professora de Francês, amava tocar piano, violão e arriscava com belo desempenho no campo da cantoria. Podemos notar que o sobrenome ‘Ayres’ de Carlos Ayres de Britto advém da sua mãe Dona Dalva. Seu pai, como vemos, foi homem destacado em Propriá, era carinhosamente chamado de Dr. Britinho.
Foi pai de 11 filhos, Bacharel em Direito pela Faculdade Federal da Bahia, atuou com maestria como Juiz de Direito em Gararu, Japaratuba e Propriá onde se aposentou. Segundo relatos da época, Dr. Britinho era um cara fácil de amizade, homem muito simples, virtuoso e intelectivo. Chegou a ingressar como membro do Conselho de Cultura de Sergipe, foi poeta e escritor dos mais prolíficos. Publicou belo livro, intitulado ‘Pedaços de Mim Mesmo’, que lhe rendeu ingresso na Academia Sergipana de Letras.
Faleceu num dia 17 de abril do ano 1997, aos 87 anos deixando espólio de ensinamentos valiosos a todos os filhos, dentre os quais aqui vamos enfatizar Dr. Carlos Ayres Britto. Seguindo a tradição dos Brittos, Ayres forma-se em Direito no ano de 1966 pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), instituição onde depois viria a atuar como reluzente professor. Concluiu seu Mestrado em Direito do Estado no ano de 1982 e seu Doutorado em Direito Constitucional no ano de 1988, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, tendo como orientador de sua tese, o Professor Celso Ribeiro Bastos.
Foi professor da Universidade Federal de Sergipe durante os anos de 1973 a 1983 e depois de 1990 a 2003, ministrando diversas disciplinas, dentre as quais: direito constitucional, administrativo, teoria do estado e ética geral e profissional. Deu aulas de forma pioneira sobre Direito Constitucional na Faculdade Tiradentes (Unit), entre os anos de 1980 a 1983, bem como na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 1981, sendo assistente do professor Michel Temer.
Iniciou seu percurso profissional no exercício da advocacia no ano de 1967 e ocupou, em Sergipe, as chefias do Departamento Jurídico do Conselho de Desenvolvimento Econômico do Estado (Condese) entre 1970 e 1978. Foi Consultor-Geral do Estado no então governo José Rollemberg Leite entre os anos de 1975 a 1979. Atuou como idôneo Procurador-Geral de Justiça em 1983 e 1984, sendo que foi também Procurador do Tribunal de Contas do Estado de 1978 a 1990.
Ayres Britto foi conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entre 1993 e 1994 e membro atuante na Comissão de Constituição e Justiça do referente órgão nos sucedâneos períodos: 1995 a 1996 e 1998 a 1999. Tomou posse como ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 25 de junho do ano 2003, e em 2004 foi admitido ao grau de Grande-Oficial especial da Ordem do Mérito Militar. Quem diria que um garotinho humilde de Propriá guiado por seu espírito irrequieto traçaria uma mais que brilhante carreira, donde desfrutaria de árvore frondosa da reta justiça.
Chegou a presidir o Tribunal Superior Eleitoral entre o dia 06 de maio do ano 2008 a 22 de abril do ano 2010, em que sucedeu o ministro Marco Aurélio. Em sua gestão, houve maior número de mandatos de políticos cassados. Durante esse tempo, estampou várias capas de revista pela sua conduta exemplar, chegando a ser considerado um dos 100 brasileiros mais influentes no ano de 2009.
Durante seu fecundo tempo como ministro, Ayres Britto foi relator de alguns processos que tiveram enorme repercussão. Dentre os quais podemos enfatizar: julgamento da constitucionalidade da utilização de células-tronco embrionárias para pesquisa no sentido de curar doenças crônicas, a questão da proibição do nepotismo, reconhecimento do matrimônio entre pessoas do mesmo sexo, demarcação de terras indígenas, mais especificamente no caso da Terra Indígena de Raposa Serra do Sol, em Roraima, e a inconstitucionalidade da Lei de Imprensa, esta sendo célebre em que afirmou: “A liberdade de expressão é a maior expressão de liberdade e a liberdade de expressão num plano individual corresponde à liberdade de imprensa num plano coletivo”.
Afeito ao diálogo e sensível às conversações que aglutinam, Ayres Britto desempenhou papel ímpar nesse entremeio analisado. Foi eleito presidente do Supremo Tribunal Federal num decisivo dia 14 de março do ano 2012. Empossado no dia 19 de abril, permaneceu até o dia 18 de novembro do citado ano, após ter completado 70 anos de idade, sendo aposentado assim compulsoriamente conforme regra vigente na Constituição Federal. Presidiu também nesse tempo auferido o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Devemos enfatizar: Carlos Ayres Britto foi o primeiro sergipano na história a ocupar a Presidência da mais alta corte de Justiça do Brasil.
Dentre os ministros inseridos na Corte foi o quinto, mas o primeiro a sair diretamente de Sergipe. Pelas nossas pesquisas, sua reputação sem nódoas se localiza como a de um juiz que se ocupou das questões sociais, especificamente, àquelas referentes a salvaguarda da dignidade do ser humano e causas de lancinante apelo coletivo, o que desempenhou com todo zelo e integridade. Tanto dentro do ambiente jurídico quanto fora dele, é notório que Ayres Britto tem seu percurso marcado pelo forte humanismo, literato dos mais efervescentes e sendo figura de fácil convívio.
Quando deixou o STF, retornou com toda energia e entusiasmo que lhes são inerentes para o universo advocatício. Pela sua inelutável relevância, foi presidente da Comissão Especial de Defesa da Liberdade de Expressão da OAB, abrindo um dos mais prestigiados escritórios de advocacia em Brasília.
É conhecido também como o jurista poeta. Não se limitou a publicar obras de cunho puramente jurídico, mas, sobretudo, volumes com poemas de inspiração existencial. Ama fazer trocadilhos de astúcia semântica exemplar, quem não lembra dele discursando, fazendo a seguinte afirmação: “Há quem chegue às maiores alturas para fazer as maiores baixezas” ao discutir sobre corrupção.
Pela sua amplificada obra e diversos artigos publicados, é membro destacado na Academia Brasileira de Letras Jurídicas e da Academia Sergipana de Letras. No plano de atuação como magistrado, nunca se deixou contaminar pela subserviência, muito pelo contrário, teve coragem e percebe que um juiz pusilânime trai a cidadania e corrompe a constituição. Dentre seus livros na ambiência jurídica e da poesia, podemos elencar alguns: “Teoria da Constituição” (2003), “O humanismo como categoria constitucional” (2007), “Teletempo” (1980), “Um lugar chamado luz” (1984), “Varal de borboletas” (2003), “Ópera do Silêncio” (2005) dentre vários outros.
Além disso, é conferencista requisitado, fazendo palestras luminosas sobre temas hodiernos. Em seu âmbito doméstico, é casado com Rita de Cássia Pinheiro Reis de Britto por quem nutre amor sem limites e contínua admiração.
Conclui-se que Ayres Britto, figura das mais icônicas que passaram pelo Supremo Tribunal Federal, seja em sua faceta de professor sapiente, poeta sergipano dos mais eloquentes, deixa legado de votos riquíssimos para analisarmos ainda hoje a realidade brasileira. Sua pulsante alma nordestina jamais esteve ausente dos seus ensinamentos e lides que enfrentou perante as sinuosas tormentas da vida. Como astucioso escritor, se imortaliza no seguinte quesito: apesar de muitas vezes a caligrafia das leis serem glaciais, Ayres Brito nos ensina que a metodologia jurídica não precisa estar desvinculada da arte.
Ayres Britto é grande pensador do Direito, genuíno estadista, daqueles defensores ferrenhos da Constituição. Homem sábio, que se destacou e se realça pela sua simplicidade e jeito singelo de agir. É por isso que se diz ser unânime: não há quem não saia se sentindo melhor após dialogar com Carlos Ayres Britto, o esculpidor de gentilezas. Como pai amoroso que é, deixa para os seus cinco filhos, Nara, Adriele, Marcel, Adriana e Tainan os valores de ser humano atento às causas do bem comum e sentimento de cristalina justiça.
Se costuma dizer que as pessoas passam e as instituições são inabaláveis, diria nesse caso que pessoas como Carlos Ayres Brito permanecem, pois são extraordinárias em toda sua plenitude. Somos afortunados!
¹ Texto escrito por Igor Salmeron, Sociólogo - Doutorando em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Sergipe (PPGS-UFS), faz parte do Laboratório de Estudos do Poder e da Política (LEPP-UFS). Membro vinculado à Academia Literocultural de Sergipe (ALCS) e ao Movimento Cultural Antônio Garcia Filho da Academia Sergipana de Letras (MAC/ASL).
E-mail para contato: igorsalmeron_1993@hotmail.com
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